sexta-feira, 24 de abril de 2015

Espetáculo de dança-teatro discute a velhice e a morte

Jornal Cruzeiro do Sul
Felipe Shikama 

Partindo de texto de Samuel Beckett, Mariana Muniz apresenta "D"existir"



A premiada atriz, bailarina e coreógrafa Mariana Muniz - CLÁUDIO GIMENEZ / DIVULGAÇÃO


Com referência poética no texto Mal visto mal dito, de Samuel Beckett, uma velha artista andarilha se vê às voltas com uma série de questionamentos sobre o sentido dos próprios movimentos. Essa é a síntese do espetáculo solo de dança-teatro D"existir, que a bailarina e coreógrafa Mariana Muniz apresenta neste sábado, às 20h, no Parque do Matão, em Votorantim. A entrada é gratuita. O espetáculo faz parte do projeto Parque da Autonomia - Espaço Ambiente Coreográfico Coletivo O12, e marca o encerramento da temporada realizada com apoio do Programa de Ação Cultural (ProAC).

A partir de uma visão crítica da sua história na dança e no teatro, Mariana Muniz decidiu mergulhar em seus próprios movimentos para tratar de temas inquietantes e iminentes como a velhice e a morte. O espetáculo é resultado de uma pesquisa que teve início em setembro do ano passado, a partir da constatação de Mariana sobre as transformações que ocorriam em seu próprio corpo. "Diante disso, eu quis experimentar o que o meu corpo tinha vontade de fazer, mas eu não sabia como entrar no processo de criação", lembra.

Em busca de um texto capaz de ancorar com mais profundidade essa íntima pesquisa corporal, Mariana encontrou Mal visto mal dito, do escritor e dramaturgo irlandês Samuel Beckett que, além de sugerir os movimentos corporais da artista, traça a narrativa de uma velha senhora que está no limiar entre a vida e a morte. "Esse texto não é uma peça, e sim uma novela que tem uma tessitura teatral muito revolucionária. Tem muitas imagens relâmpagos, que me ajudaram a construir a personagem, mas nada está dado", diz.

Interpretando o texto e se movimentando em cena, Mariana cria uma dramaturgia que parece misturar ficção às suas próprias memórias de artista. Com cerca de 50 minutos de duração, o espetáculo tem supervisão geral de Eduardo Tolentino de Araújo. A trilha sonora original foi composta por Celso Nascimento e a iluminação é de Ricardo Bueno. O figurino é assinado por Fabio Namatame. Mariana assinala que assim como o texto de Beckett, D"existir - ou de existir - se traduz como uma "forma de continuar os movimentos apesar das mortes interiores de cada dia".

O trabalho nasceu do desejo de revisitar, sob uma ótica diferente, outro solo de teatro-dança interpretado por Mariana intitulado Speranza! Dona Esperança, dirigido por José Possi Neto e realizado em 2008. "É um desdobramento. Em Speranza, que não tem texto, há uma mulher confinada no espaço do quarto. Em D"existir há uma mulher, só que confinada no espaço do mundo", acrescenta. Há quem diga que o processo criativo adotado pela artista neste espetáculo foi "inverso", visto que ela partiu dos movimentos para, em seguida, apoiar-se ao texto. Sem precisar negar com veemência, Mariana explica "inverso é relativo" e que o caminho percorrido foi "natural". "Quando a criança é pequena, ela primeiro prepara o corpo e depois a escuta. Eu fiz esse mesmo trajeto, por isso me senti tão incorporada", compara. Natural para Mariana Muniz também é a conexão entre o teatro e a dança. "Pensar as artes cênicas nesta interseção nos permite lançar mão da potência expressiva do gesto com um olhar diferenciado e sempre renovado", acredita Mariana Muniz.

Durante o processo de criação de D"existir, Mariana contou com a participação da atriz e ex-bailarina do Teatro Municipal do Rio de Janeiro Clara Carvalho, que atuou como "provocadora convidada", apresentando propostas para desestabilização dos apoios corporais e cênicos. "No fim, ela ajudou a conscientizar as minhas próprias escolhas em cena", resume.

Neste sábado, das 14h às 17h, Mariana Muniz ministrará uma oficina de artes corporais no Espaço Ambiente Coreográfico Coletivo O12 (rua Angelo Delapasi, s/nº, Parque Bela Vista, em Votorantim). As inscrições são gratuitas e devem ser feitas pelo e-mail workshop@ coletivoo12.com.br. Não é necessário ter experiência em dança ou teatro.

Trajetória

Formada em dança pela Escola do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, a pernambucana Mariana Muniz dedica-se ao trabalho em teatro e dança contemporânea desde 1974. No teatro, participou de importantes produções, atuando sob direção de Eduardo Tolentino, Domingos Nunez, Samir Yazbek, Sérgio Ferrara, Ulisses Cruz, Gianni Ratto, Gabriel Villela, Jorge Takla, Roberto Lage, Naum Alves de Souza e Antonio Abujamra. Recebeu os prêmios Shell de Teatro/melhor atriz (2009), APCA de intérprete em dança com Dantéa (2000); APCA de autora-intérprete em dança com Paidiá (1989); APCA de revelação como coreógrafa em Corpo de baile (1988), entre outros.

Serviço

O espetáculo de dança-teatro D"existir, com a atriz e coreógrafa Mariana Muniz, será apresentado neste sábado às 20h, no Espaço Ambiente Coreográfico Coletivo O12, que fica no Parque do Matão, em Votorantim (rua Angelo Delapasi, s/nº, Parque Bela Vista).

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